“É tão estranho, os bons morrem jovens. Assim parece ser quando me lembro de você. Que acabou indo embora, cedo demais.” Renato Russo
Certa vez conheci um garoto que à primeira vista era como qualquer outro, com suas incertezas, inseguranças e rebeldia. Isso foi 1995, primeiro ano do ensino médio.
Esse garoto cuja ascendência nunca foi revelada – algo entre turco e libanês – tinha um poder incrível de cativar as pessoas com sua simplicidade e naturalidade, talvez por isso vivesse tão rodeado de amigos.
Uma figura ímpar. Nascido em uma família de classe média alta, tradicional, com posses e sobrenome conhecido lá pras bandas do Triângulo Mineiro, ele optou pela simplicidade. Na verdade acho que nem foi uma opção, e sim o caminho natural a ser percorrido pela sua alma. Não podia ser de outra forma, ele era assim, nem dinheiro, fama ou prestígio poderia mudá-lo. Não sonhava com carros importados e sim com uma Kombi, pois esta seria como seu coração, grande o bastante para caber todos os amigos.
Era uma figura despretensiosa, sem grandes ambições, só sonhava em ser médico, não por dinheiro, conforto ou status, creio eu, mas para continuar cicatrizando as feridas do corpo e da alma das pessoas. Podia ser tudo o que quisesse, era de uma inteligência impressionante, multitalentoso e dono de um carisma que lhe abriria todas as portas que quisesse. Mas como já disse, era despretensioso, alheio aos padrões impostos pelos modismos de uma cidade ainda com ares coronelistas, parecia se divertir com as críticas e olhares infames sobre as suas roupas, seu cabelo, sua barriga, sua linguagem propositalmente chula e seus trejeitos espalhafatosos.
Teve que amadurecer muito cedo, graças à perda prematura do pai. Caiu sobre ele toda a responsabilidade de “homem da casa”, por ser o mais velho filho varão. Tarefa desempenhada com sucesso, que lhes digam os irmãos e a mãe viúva. Talvez por ter amadurecido assim tão rápido, sua missão nessa Terra tenha se completado ainda tão cedo. Quem pode entender os desígnios de Deus? E por isso se foi, se despediu de todos nós naquela curva com o motor em alta rotação e o coração disparado.
Não tive coragem de vê-lo no caixão, queria guardar só as imagens felizes de outrora, por isso fiquei lá, olhando com os cantos dos olhos o perfil da caixa de onde saíam suas mãos pousadas sobre a barriga. Senti-me impotente, sozinho.
Ele não chegou a se formar médico, mas tenho a certeza de que está agora curando as feridas dos que a ele chegam, enfermos de toda uma vida passada nesse planeta.
sexta-feira, 23 de maio de 2008
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